Por Andréia Barbosa de Lima*
Chegamos no mês de junho de 2021 com mais de 176.000.000 de mortes no mundo decorrentes do novo coronavírus. No Brasil, são mais de 480.000 mortes, marca que nos destaca como o 2º país do mundo em número absoluto de mortes e o 9º em óbitos proporcionais à população.
No entanto, é preciso pensar esse número não somente do ponto de vista estatístico, mas com outro sentido e significado. Sentido que nos assola, causa dor, revolta, tristeza, medo e insegurança. Diante de números assustadores, é extremamente comum o sentimento de angustia e de incertezas.
Vivemos cercados e imersos em morte, tanto local, regional, nacional e global. E mesmo diante da adoção de medidas não farmacológicas, como o isolamento social, distanciamento e o uso de máscara, a Covid-19 está ceifando vidas, destruindo sonhos e mutilando famílias e rede de amigos de forma trágica.
Muitos experenciaram a dor de perder alguém significativo como um pai, mãe, irmão, filho, um amigo, um ídolo ou outra pessoa que admirava e mantinha laço afetivo. Caso não tenha perdido alguém, pode ser um daqueles que, assim como eu, sente a dor da perda de tantos.
Essas perdas são diárias e repercutem nos noticiários, no nosso trabalho, no nosso grupo de amigos e conhecidos de conhecidos. São pessoas que para muitos são anônimas, mas “que poderiam ter ficado um pouco mais”, que deixaram um vazio na vida de um filho ainda bebê, uma criança na fase escolar que não vai ter aquela figura para entregar uma lembrança do dia dos pais ou das mães. A mãe que perdeu um filho precoce e também aqueles que perderam várias pessoas da mesma família e que a dor é inimaginável. Muitas vezes, não é possível nossa mente comportar tamanho sofrimento.
Diante de tantas mortes, é importante compreender que o luto é um processo que envolve respostas a uma perda por morte, a um rompimento de vínculo, seja pela perda de alguém ou algo significativo em nossas vidas. Desta forma, a pandemia trouxe à tona as várias facetas das perdas, pois envolve outras formas de relacionamento referentes ao isolamento social, à culpa da infecção e a incapacidade em muitas situações de não realizar funerais, interrompendo as vivências comuns do luto.
Cada vez mais, a morte e luto se aproximam de todos nós e algumas estratégias são importantes para amenizar e dar apoio aos enlutados, como:
- Compreender que luto não é doença, mas um processo de sofrimento e tristeza diante da perda e do lugar que a pessoa ocupava na vida da pessoa, da família, na sociedade e outros.
- Entender que enlutados precisam de atenção e cuidado, o que auxilia no processo de elaboração das famílias, no resgate e continuidade da vida dos que ficaram (sobreviventes).
- Oferecer estratégias remotas de despedida, utilizando a tecnologia para a despedida, como ligações por vídeo, mensagens, entre outras.
- Entregar os pertences às famílias, recorrendo ao recurso simbólico da Caixa de Memórias.
- Realizar rituais fúnebres alternativos, como cultos e missas de forma virtual, além de outros rituais considerando as crenças de cada um.
- Potencializar as redes religiosas e espirituais.
- Realizar o monitoramento psicossocial com apoio da rede socioafetiva do enlutado.
- Permitir a expressão dos sentimentos de forma genuína, ter um espaço para compartilhar a dor.
- Se disponibilizar.
- Ouvir e acolher.
- Orientar a buscar auxílio especializado de um profissional caso necessário.
Frente às inúmeras situações de perdas, é importante considerar as reações emocionais diversas que podem surgir e não interditar esse processo. Achar “que a pessoa tem que ser forte” e “que tem que superar” não colabora, pois é necessária a vivência da perda. O luto mobiliza a nossa própria finitude, sendo difícil até para muitos profissionais da saúde lidarem com essa situação e atendimento ao enlutado. Nesse sentido, é preciso oferecer suporte psicológico para aquelas pessoas que poderão ter dificuldades no processo de luto, ou seja, em restabelecer sua vida.
No caso das mortes causadas pela Covid-19, algumas situações colaboram para que esse processo seja mais difícil, pois as perdas são inesperadas, parecidas com situações de acidentes ou doença súbita.
Assim, aproveito a oportunidade para compartilhar que a FIB, por meio do curso de Psicologia, oferece atendimento psicológico e plantão psicológico. A Clínica Escola de Psicologia Aplicada (CEPAFIB) funciona no campus da instituição e está de portas abertas para ser um espaço de escuta e apoio para pessoas que estejam passando por momentos de dificuldades ou em crise emocional.
Lembre-se, somos seres humanos com sentimentos e emoções, seja gentil com sua dor, permita-se sofrer as perdas, elas doem e muito.
*Docente e Coordenadora do Curso de Psicologia da FIB. Psicóloga Clínica, especialista em Psicologia Hospitalar pelo Conselho Federal de Psicologia. Mestre em Psicologia do Desenvolvimento e Aprendizagem pela Unesp.
Referência
Saúde Mental e Atenção Psicossocial na Pandemia COVID-19: processo de luto na COVID-19. Adriana Silveira Cogo, Bernardo Dolabella Melo, Daphne Rodrigues Pereira, Fernanda Serpeloni, Juliana Fernandes Kabad, Maria Helena Pereira Franco e Michele Souza e Souza. Fio Cruz, 2020.